Março de 2018. Segundo ano da faculdade. Passei os meses anteriores entre tentativas de fotografar aquilo que estava ao meu redor. Meus amigos andando pela Unicamp. Prédios por onde passava todos os dias. Flores e folhas caídas no caminho. Luzes espalhadas pela cidade. O movimento ao meu redor era para onde eu olhava.
Em uma feliz coincidência, conheci a Amanda. Coincidência porque nossos pais eram amigos próximos quando tinham a nossa idade. Sem querer, nos encontramos e descobrimos que estudávamos no mesmo instituto — eu na Midialogia, ela na Dança. Também descobrimos que eu tinha fotografado um evento que ela tinha organizado, mas pela correria do dia, não nos encontramos.
Ela me perguntou se eu ainda tinha interesse em fotografar dança e se queria fotografar o grupo de TCC dela. Falei que sim. Eu não sabia nem como fazer um orçamento, muito menos qual equipamento seria adequado, nem sequer pensei como iria me organizar. Mas, sei lá, alguém queria me pagar para fotografar, então eu fui.
Passei o ano acompanhando o Grupo Entrepont.s enquanto eles criavam o seu espetáculo final “Em todo tempo, nunca”. Foram ensaios, abertura de processo, passagem de luz até chegar ao resultado final. Enquanto eles estavam imersos em seus estudos de movimentos, improvisações e concepção de figurino, eu olhava para eles através da câmera e, assim, lidava com o meu processo.
Através daqueles registros, entendi como eles se comportavam naquele espaço e, por consequência, como eu me comportaria. Aprendi a olhar para braços e pernas, assim como precisava olhar para o corpo inteiro. Passei a reconhecer a individualidade de cada um — eram onze intérpretes-criadores — da mesma forma que via o coletivo em um movimento.
Sofri com as luzes. Acabei com a memória do meu computador. Passei horas na edição. Quase travei as costas — ainda bem que eu fazia pilates nessa época. Me desdobrei entre meus trabalhos de fim de semestre e os espetáculos.
No meio desse caminho, conheci a Giovanna. Ela viu o que eu estava criando com aquele grupo e perguntou se eu tinha interesse em fazer o mesmo com o dela, o Núcleo 600mg. Também não pensei muito, só fui. Outra pessoa queria me pagar para fotografar. Que doido.
Em um processo parecido e muito diferente, passei a acompanhar os ensaios finais, passagens de luz, teste de figurino e o espetáculo final “Não havia o que chamar de antes”.
O final de 2018 foi intenso. Mas foi muito incrível. Lembro do quão maravilhada fiquei com esses espetáculos, o quão animador era as pessoas comentarem do meu trabalho, o quão feliz ficava quando chegava para encontrar os grupos e quão empolgada ficava a cada clique.
De lá pra cá, outros grupos e artistas da dança chegaram até mim para que eu registrasse seus processos e espetáculos. Já teve performance na praça, pelo prédio do Barracão, com luz do sol. na penumbra, pelas ruas da Unicamp, na pandemia, na praça do Dalben, na escadaria da Educação, na sala AD01.
E o que sempre me trás de volta para a fotografia de dança é que essa arte depende de outra para existir. Enquanto eles criam os seus processos, eu crio o meu. E em algum momento, esses processos se fundem. O registro do processo criativo em dança é o meu processo criativo em fotografia.
Em um movimento contraditório, capturo momentos que se vão e que não voltam mais. Eles se movem pelo espaço-tempo, e eu crio uma imagem de um fragmento desse corpo em movimento.
Essa semana, “em processo” completa um ano. Um ano que escrevo e publico meus textos.
Não posso dizer que faz um ano que estou escrevendo, porque faço isso há muito tempo. Mas, posso dizer que faz um ano que tem alguém lendo o que escrevo.
Nas minhas redes sociais — que não são tão ativas, isso não é um jabá — fiz uma retrospectiva desse um ano a partir dos textos mais lidos por vocês. Enquanto eu selecionava os textos e organizava essas postagens, percebi como eram registros claros de como o meu processo, como um todo, tinha andado nesse tempo.
E quando digo “andar” é porque esse movimento foi, em alguns momentos, lento. Em outros, foi animador, para logo depois me deixar lá embaixo. Dias em que tinha certeza que nada iria me impedir e dias que precisava de força para levantar da cama. Já contei um pouco sobre isso na última edição.
Ao olhar para o caminho que passamos — porque essa news não existe sem seus fiéis leitores — pude ver esses movimentos na minha vida pessoal e profissional. Pude ver como o que eu escrevi, refletiu nas fotografias que criei nesse tempo. Ou de como lidei com as idas e vindas de trampos. Como a escrita e a pintura andaram juntas, me permitindo aperfeiçoar a minha criatividade e entendê-la melhor. Como eu criei uma rotina saudável entre minha vida pessoal, meu trabalho e a minha arte — ainda tem tanta coisa para melhorar.
Assim como aquelas fotografias foram o registro do meu processo criativo, esses textos aqui publicados são um diário dessa pequena jornada. Espero que daqui mais um ano, quando fizer a retrospectiva do segundo ano de newsletter, esse diário continue a me mostrar que a única coisa que posso fazer é confiar no processo.
Compartilhando ou não, documentar e gravar o seu processo na medida em que ocorre traz suas próprias recompensas: você começará a ver o seu trabalho mais claramente e sentirá que está progredindo. E quando estiver finalmente pronto para dividi-lo, terá um material bruto extenso.
Mostre seu trabalho, Austin Kleon
Ufa, já estamos caminhando para o fim. Afinal, edição de aniversário pode ser um pouco mais longa, né?
Antes de ir, dois convites:
essa semana fui no Pavão Cultural assistir o Trio Cordi. Acompanhei esses músicos de longe durante a graduação e a Cecília fez a trilha de “Do lado de cá”. Vê-los ao vivo foi incrível e se você tiver a oportunidade, vá! Eles estão entre Campinas e São Paulo, acompanhe-os nas redes para não perder o próximo. Aproveite para conhecer a campanha de financiamento do primeiro disco deles.
você, amante das artes, das ilustrações, do mercado editorial, tem que vir no Trocando Ideias + Desenhaço, evento que acontece no próximo sábado (29/10) na Casa Locomotiva. Também conhecido como o primeiro evento que estou organizando lá na firma. Venha! Todas as infos nessa publicação.
Mais do nunca, obrigada pela leitura <3
Essa newsletter é gratuita, para todo mundo que quiser chegar. Aproveite para compartilhar com quem você acha que possa se interessar por essa jornada!
Um beijo e até a próxima!