Eu tenho um problema no joelho. Não sei explicar em termos muito técnicos, sei que as articulações não são como deveriam ser. Não é grave, porém, pode me atrapalhar bastante. Tem dias que nem tanto, outros que não consigo encontrar posição para dormir. O ponto é que tive que começar a fazer exercício para resolver, ou diminuir, o problema — era isso ou uma mesa de cirurgia.
Há quase um ano na academia, aprendi que não preciso exercitar, necessariamente, o joelho e sim coxa, glúteo e quadril. Não, eu não virei rata de academia, mas é interessante perceber como aprender a movimentar corretamente cada um desses músculos, afeta um pedacinho do meu corpo, podendo curar a minha dor. Às vezes posso ter alguma crise de dor, mas pelo menos eu sei o que preciso corrigir.
O mesmo acontece com a nossa criatividade, qualquer que seja a sua área de atuação. Já contei sobre minhas aulas de desenho e como são essenciais para eu continuar a criar. Muitos exercícios de pintura partem do meu trabalho de fotografia e, por consequência, muitas da experimentações acabam influenciando minha fotografia, funcionando de uma forma cíclica. Tivemos uma época que criamos algumas imagens a partir de textos que estava lendo e que as reflexões que tivemos enquanto pintávamos viraram algumas palavras na newsletter.
Para além, algo que me inspira muito é o cinema e a televisão. Eu que passei boa parte dos últimos anos aprendendo a analisar e produzir essas mídias, entendi — depois de muito surto em set — que não tenho vontade de criar nessas áreas. Porém, acompanhar o que tá saindo, o que vai para premiações e até analisar, são combustível para minha criatividade — principalmente para entender construção de narrativas. Quando estava criando em videodança, lembro de juntar algumas referências em cinema para entender o que eu buscava criar.
Essa edição está sendo escrita em uma segunda-feira a tarde. Nunca faço isso, sempre prefiro deixar esse momento de escrita para quinta ou sexta, gosto de deixar a semana para pensar no texto, reunir algumas ideias, coisas que vi por aí. Porém, acordei, tomei meu cafézinho, limpei minha mesa e fui ler alguns textos que deixei na lista de leitura para quando tivesse um tempo. Textos diferentes, que me tocaram. Textos que me identifiquei. Textos que me deram vontade de escrever. Ainda precisa terminar e revisar um artigo para o Valks que deixei para hoje. De repente, esse texto aqui começou a nascer.
E você deve olhar para o título e querer entender por quê “caderno”. Também já contei que coleciono cadernos, que carregam partes de mim ao longo do tempo. Documentam algumas crises, alegrias, ideias, listas de mercado e rascunhos de projetinhos. Quando comecei as aulas de desenho, encomendei um caderno com a Mari, para que eu pudesse criar sem medo de “gastar” folhas canson e tinta. Que servisse com um cantinho só meu — eu e as pincelas despretensiosas. Logo na primeira página escrevi “confia no processo”.
Dentro desse caderno tem algumas páginas confusas, outras com misturas de tintas, algumas que gosto, outras que nem tanto. Tem um pouco de colagem, acrílica, nanquim, aquarela. Tem muitos desenhos abstratos, alguns estudos de corpo, outros rabiscos. Teve dias que eu estava bem e outros que descontei minha ansiedade no papel.
Em algumas páginas escrevi, com uma letra arrastada:
tenho sentindo necessidade da experimentação e do registro do processo , seja em imagens ou em palavras, não sei se é pela incerteza do que vem pela frente ou por medo de tomar o próximo passo
queria conversar com pessoas sobre o que estou sentido ao mesmo tempo que me sinto num buraco
não sei mais criar?
tenho vontade de ser lida, de criar diálogos, de comunicar com outros artistas
queria que artistas tivessem menos medo
ser artista não é uma crise, a crise é continuar criando
não quero 15 segundos de atenção
nada se joga fora, tudo se aproveita até a última gota e o último retalho
unir para ter algo novo e ter novos sentidos, porque os que tinha antes não eram suficientes
Compartilho aqui algumas dessas palavras porque o caderno acabou. Preenchi todas as páginas, levou menos tempo do que imaginei e fiz mais do que ousei sonhar. O caderno acabou e eu já encomendei um novo, porque preciso de mais páginas, em branco, para preencher com a bagunça que está dentro de mim, até colocar ordem nela e poder colocar de volta no mundo.
White.
A blank page or canvas. His favorite.
So many possibilities...
Assim como eu exercito outros músculos para ter meu joelho no lugar, eu mexo com diferentes expressões artísticas para continuar a criar. Porque os dias de seca, de dúvida, de bloqueio, eles sempre vem. Mas eles não conseguem ficar por muito tempo, eu sempre volto para o caderno, para as suas páginas, para o que eu deixei ali.
Quase podia sentir a solidão daquela artista durante as horas em que passava pintando, talvez em transe, as cenas a que havia assistido em seus sonhos. Qual histórias vou contar?, começou a se questionar, percebendo que aquelas mãos na caverna também era suas. — Aline Valek, Cidades Afundam em Dias Normais
Coisas legais que me inspiram
estou em crise com meu guarda-roupa, não gosto mais das minhas roupas, mas não sei do que gosto, então estou buscando blogueiras que falem de estilo dentro da minha realidade. Conheci a Melody, que é blogueira mesmo, com foto e textão. Além da Matilda nos vídeos!
“Boa noite, Internet, boa noite, Brasil. Eu sou o Cris Dias”. Conheci esse podcast quando fazia a pesquisa pro meu TCC, em 2020. Ouço enquanto cozinho, faço faxina ou no ônibus. Dou risada alta e fico reflexiva com minha vidinha.
li e me emocionei com “Antes que o café esfrie”. Quatro histórias de viagem no tempo, todas dentro de um café em Tóquio.
O que você tá vendo de legal por aí?
Já encerrando as atividades dessa semana, o artigo que eu precisava finalizar saiu momentos antes de eu revisar essa edição e enviar. Escrevi sobre as HQ’s Pílulas Azuis e Oleg, de Frederick Peeters. Esse formato é bem fora do que estou acostumada na leitura e foi uma experiência ótima, espero que você se sinta convidado a lê-las!
Ei, essa foi a décima quinta edição de “em processo”. E chegamos em 52 pessoas que leem essa newsletter!
Feliz de chegar até aqui!
Obrigada pela sua leitura <3
Um beijo e até a próxima!
Sempre bom poder partilhar das aulas com você. Obrigada por estar aberta a criatividade e a encontrar a si mesma através da arte.