O sol nasce na janela do meu quarto. A minha cama fica embaixo da janela. Quando precisava lutar contra o sono das seis da manhã, dormia com a janela aberta para acordar com o sol. Hoje não faço mais isso porque meu corpo acostumou a acordar 5h30 — e porque Minerva gosta de subir no meu travesseiro. A luz do sol vai passando e aprendi a saber a hora de acordo como o meu quarto está iluminado — me sinto conectada com a natureza quando acerto.
Já contei em edições passadas que a minha mesa de trabalho fica de frente para a janela. Vejo o fundo da casa dos vizinhos, as maritacas, as nuvens indo e vindo – vejo o dia passar. Coisa que não tinha no meu antigo trabalho, em que apenas tinha uma janelinha na sala e só sabia a hora quando a configuração automática do computador mudava para modo noturno.
Antes da pandemia, a mesa ficava em outro canto, de frente para a parede, porque eu não usava. Mas, no desespero de ficar em casa, eu precisava ver o céu azul. Foi o mesmo motivo que me levou a fazer exercício todos os dias – logo eu, que sempre odiei exercício físico. E não é como se eu amasse agora, mas acho que fizemos as pazes.
Mas, hoje, nesse exato instante, não estou vendo minha janela. No intuito de fazer as pazes com o exterior, diminuir as minha paranoias e – para o orgulho da minha terapeuta – sair de casa, eu vim para uma cafeteria. Saí da academia (sim, isso mesmo que você leu), vim até o Abigail, pedi uma torrada com geleia de frutas vermelhas, um café com leite e estou sentada de frente para a área externa, vendo uma pintura no muro e plantas. Muitas plantas.
Enquanto escrevo, me pergunto se vou fazer repetir isso semana que vem. E na outra. Se sempre virei nesse café. Ou se vou explorar outros. Talvez eu precise repensar os looks de andar na rua porque esqueci como faz calor nessa cidade. Também preciso repensar que brincos grandes e máscara são difíceis de lidar. Não sei se isso vai ser uma nova rotina. Mas estou tentando.
Estou tentando andar de novo pelas ruas. Tentando retomar os encontros com amigos. Tentando ouvir músicas novas. Tentando não odiar tanto assim a academia. Tentando beber leite vegetal — é bem mais leve, acho que vou manter isso com certeza.
Assim como tentei pintar ao longo desse ano. Tentei fazer uma videodança. Tentei explorar autorretratos. Tentei elaborar uma instalação online. Tentei criar um perfil profissional na internet. Tentei fazer colagens digitais. Tentei fazer um podcast. Tentei escrever. Estou tentando.
Algumas dessas coisas deram certo, outras ficaram mais ou menos e outras eu joguei na lixeira sem dó. Quantas vezes lemos pela internet enjoy the process? Isso é lindo, mas quando vem acompanhado de culpa, sabotagem, cobranças e medo, pode resultar em você sentada no chão do banheiro, chorando e mandando áudio para amigos – been there, done that.
Acabei de ficar 10 minutos olhando pra tela e procurando um jeito de continuar. Com o perdão da expressão, é sobre isso – continuar tentando enquanto não se sabe para onde está indo. Sou muito fã de experimentações. Pegar uma câmera e ver o que acontece se enquadrar de determinado ângulo com uma luz diferentona. Colocar três tintas diferentes no pincel. Deixar a caneta passear pelo papel, seja em rabiscos ou em palavras. Selecionar 5 imagens que não têm conexão e criar uma colagem. Acelerar, espelhar e remixar vídeos.
A cada dia eu tento me desprender um pouco mais da ideia de dar certo. Especialmente, quando estou nessa fase de um processo. Qualquer projeto que faço preciso desse momento. Pra ver até onde eu consigo ir, o que preciso melhorar, o que não vai dar certo mesmo, quais são os recursos que faltam.
Ano passado, li "O caminho do artista", da Julia Cameron. Ela propõe o exercício das páginas matinais: todos os dias, ao acordar, escrever três páginas. Sem pensar, sem questionar, sem corrigir. Passei 2020 tentando colocar isso na rotina e não deu certo, então eu adaptei e agora é tão natural quanto a luz do dia escovar os dentes. Todos os dias, depois do exercício físico e do banho, sento para escrever o que der. Tem dias que são três páginas mesmo. Outros que são meia página. Alguns dias tiro crises de dentro de mim através das palavras, mas tem dias que apenas escrevo minha lista de tarefas. Faz parte.
As páginas são o simples ato de mover a mão sobre o papel e escrever qualquer coisa que venha à mente. Nada é mesquinho, tolo, estúpido ou esquisito demais para ser incluído (...) As páginas matinais nos ajudam a conhecer o que pensamos e o que achamos ser necessário.
Raramente alguém lerá o que tem ali, inclusive já arranquei algumas páginas, rasguei e joguei fora, mas a constância, a repetição, o compromisso em parar 20 minutos para escrever me levaram para escrever nesse café nessa manhã de quarta-feira pós academia.
outra expressão que todo mundo já ouviu e provavelmente odeia: pensar fora da caixa. Mas o que é pensar fora da caixa de verdade? E se fosse diferente?: Caminhos alternativos para despertar sua criatividade (Gabriel Gomes e Luciano Braga) traz essa proposta de pensar pequenas mudanças – um caminho diferente para o trabalho, uma apresentação de slides diferente, cozinhar um alimento comum de outra forma. Os autores defendem que propor pequenas escolhas diferentes é uma forma de exercitar a criatividade.
as vezes, continuar é ir devagar. A Bruna fala sobre leituras lentas, ir contra algoritmos e se cobrar menos da (oni)presença online. Respeitando o próprio ritmo, seus posts acontecem quando estou menos esperando e mais precisando.
uma questão de continuar tentando é achar forças em um cenário caótico e incerto — especialmente quando você mora no Brasil em 2021. O apagão das redes sociais causou surto, desespero e questionamentos sobre como seria a nossa vida sem elas. Esse vídeo da Nataly Néri fala sobre entender como viver com as redes, a importância de entender como funcionam e construção de comunidade. Como ela mesma disse, não são respostas, é o início de uma conversa.
Você sabe o que é videodança? Além de ser o tema das conversas que tão rolando no podcast, é uma forma de criação conjunta entre audiovisual e dança. Uma forma que ainda está sendo explorada, definida e desenvolvida no Brasil.
Os formatos, a forma de circulação, os processos, são diversos entre si. E alguns desses processos existem apenas para experimentar, para ver o corpo e o movimento por outro olhar. Para reconhecer o espaço de uma nova perspectiva.
Essa foi a conversa que tive com a Ana C., a Catha e a Giu, artistas da dança que exploram o campo da videodança por meio de coletivos. Prepara um café, um chá, um suco e vem trocar uma ideia com a gente!
O que você tá tentando fazer? Pode ser voltar a sair depois de quase dois anos, um quebra-cabeça novo ou uma pintura. Como você está tentando?
Obrigada por ler até aqui e a gente se vê em breve!
Um beijo!